Mundo Fashion


DEPOIMENTOS DE MODELOS E HISTÓRIAS REAIS CELEBRAM A VIDA GLAMOUROSA DAS PASSARELAS

 

 


Após entrevistas com várias modelos e profissionais da moda, acompanhando o seu dia-a-dia dentro das agências, a psicóloga Miriam Tawil traça o perfil dessa profissional-menina que enfrenta tantas barreiras para alcançar o sucesso.  A autora identifica, principalmente com as histórias das modelos em começo de carreira, muitas dúvidas, angústias e dificuldades ao lidar com a própria feminilidade. O compromisso profissional com a beleza e a falta de tempo para namorar atrapalham muitas vezes as perspectivas de vida das modelos, que sentem-se como objetos manipuláveis. Algumas temem os patrocinadores que esperam manter um relacionamento afetivo ou sexual, também as enveredando para o caminho das drogas, tudo em troca da promoção de suas carreiras.

 


Tawil traz no livro a mensagem de que tudo o que elas mais desejam é ter uma vida normal, como as outras garotas de sua idade. Apesar de se sentirem acolhidas e valorizadas em suas cidades, sofrem com o pesadelo de serem recusadas para os trabalhos, o que abala profundamente sua auto-estima e sua estabilidade emocional.

 

A obra tem a finalidade de ajudar pais, mães, modelos, candidatas à profissão e leitores a ter interesse em conhecer e entender essas “personagens” modelos que existem verdadeiramente somente no imaginário das pessoas. Apresentado pela modelo Isabella Fiorentino.



AS MUSAS DA CULTURA EFÊMERA

                                                                                            

                                                                                                resenha por Reinaldo Lobo

 

             “Mundo Fashion – Modelos e Bastidores” pode ser lido como um manual de sobrevivência psíquica para jovens candidatas a Gisele Bündchen e suas inseparáveis mães. Depois das próprias jovens, a mãe de modelo (como outrora a mãe de “miss”) é quem mais precisa ler este instigante livro da psicanalista Miriam Tawil. Ela pesquisou durante oito anos as vicissitudes de uma carreira só comparável à de jogador de futebol em rapidez, brilho e dificuldade.

            Revela a vida de garotas (e garotos) que querem entrar no mundo de princesas e príncipes do “Castelo de Caras”. Um mundo de fadas madrinhas e de sonhos encantados, mas também de sapos, bruxas, cobras e lagartos. Um mundo de beleza mantida a pão e água. Ou melhor: a folhas e água.

          São todas meninas, apesar do tamanho. Com peso geralmente abaixo da relação normal com a altura, algumas estão anêmicas. Outras, em plena puberdade. Modelos, “top models”, são as estrelas do “mundinho fashion”, como elas mesmas dizem. Meninas.

           Uma delas, grandalhona e desajeitada, rosto lindo, corpo indefinido meio andrógino, magreza de anorexia, deu uma entrevista certa vez na TV segurando uma boneca de pano também comprida e desajeitada, que levava a toda parte. O apresentador do show perguntou se aquela era a sua marca registrada. Ela respondeu: “É a minha amiguinha!”

          Elas têm um público enorme. Expressam o infantil dentro de todos nós e as fantasias de possuir beleza e poder. Pertencem a máquinas maiores, um tanto infantilizadoras, mas, sem dúvida, espetaculares: a publicidade e a moda. Essas meninas são ícones do capitalismo feliz.


         Exibem-se cheias de graça pelo mundo afora, fazendo e ganhando dinheiro. Algumas, em plena euforia do êxito, brincam com drogas e, outras tantas, se prostituem. Não são a maioria. Muitas se tornam profissionais sérias, mas há também as que, mesmo assim, fracassam na profissão de curva rápida. Sofrem e se deprimem.  Além de suas famílias, quem se importa? 


Modelos, as “Top Models”, as estrelas do “mundo fashion” são muito admiradas, mas, nem por isso, deixam de ser alvo de preconceitos. O maior deles consiste em perguntar: elas têm vida mental ou são meros “cabides” dos shows de moda?

         A psicanalista Miriam Tawil decifrou esse enigma, de uma vez por todas. Revelou não só que elas possuem alma como também uma delicada estrutura psíquica, um tanto frágil, sensível e quebradiça, às vezes tão flexível quanto forte.

     Poucos duvidariam hoje da verdade contida no adjetivo “poderosa” aplicado pelos fãs e pela corte de maquiadores, fotógrafos e estilistas à personalidade de uma Gisele Bündchen. Mas, um dia, ela foi uma candidata assustada em Nova York, morando com outras modelos em algum minúsculo apartamento, tipo “república”, em plena adolescência, mal falando inglês.

    Quando passam da fase inicial da carreira, a mais perigosa, ganham alguma maturidade e, se têm a sorte de cair no “gosto do mercado”, tornam-se figuras públicas e influentes. Personagens como Naomi Campbell, Linda Evangelista, Christie Turlinghton, Elle McPherson, Cindy Crawford, Letícia Birkheuer e muitas outras.  Verdadeiras empresárias do capital simbólico (a beleza), transformam-se em mulheres de muitos milhões de dólares.

    Ao contrário da simplificação moralista, não são vendidas como mercadorias. Suas imagens é que se tornam produtos raros, de fino gosto, como as roupas que exibem. Um verdadeiro luxo, como se diz.

     Essas garotas (e garotos) de uma beleza que poderia, aparentemente, ser do século XIX sintetizam o perfil do que Jurandir Freire Costa chamou de “a personalidade somática” do nosso tempo, em oposição às personalidades “neurótica” e “narcísica” de outras épocas. São definidas pelo corpo que possuem, não por seus sentimentos, conflitos ou idéias.  São símbolos do estilo de vida da presente sociedade pós-industrial. E, se for verdade o que diz o filósofo Gilles Lipovetsky, estão no centro da cultura contemporânea, dominada pela moda. Ocupariam um lugar estratégico no núcleo do nosso imaginário. Essa cultura do efêmero seria capaz, segundo o filósofo francês, de destruir as ideologias, as crenças e os valores tradicionais, inclusive os estéticos.  Assunto sério.


O prefácio do livro é da belíssima Isabella Fiorentino, ela própria um exemplo da combinação de sucesso na carreira, elegância e amadurecimento pessoal. A contracapa é assinada nada menos do que pela da “top” Luiza Brunet, hoje também mãe de modelo. Ambas ressaltam as pressões sofridas por toda jovem candidata ao mundo “fashion”. Na obra da psicanalista Miriam, cuja empatia com as modelos é evidente, a palavra mais acentuada ao longo do texto é “cobrança”. 

        As jovens modelos são alvo de exigências internas e externas. Elas devem: manter-se “fit”; lidar com o tempo, com as viagens inevitáveis, a separação da família; há o luto pela adolescência perdida (em alguns casos, a infância), a impossibilidade de sustentarem um relacionamento fixo, a estranheza do mundo globalizado, o aprendizado de novas línguas, o assédio da mídia; precisam evitar a exploração de falsos agentes e empresários, a tentação das drogas (como  recreação ou mesmo remédios para emagrecer); fugir da depressão às vezes incontornável;  escolher os convites para festas e eventos; submeter-se à maquiagem e às roupas exigidas; tirar os pais da classe média ou mesmo da pobreza, mandar-lhes dinheiro; conquistar um público;  sobreviver psiquicamente e, quem sabe, alcançar algo como o amor ou a felicidade. Cobranças, demandas, pressões.   

        Não é por acaso que Luiza Brunet e alguns profissionais mais sensíveis de agências recomendam explicitamente às garotas que façam alguma psicoterapia. Seria uma forma de preencher o hiato de amadurecimento, forçado pela perda do ambiente familiar, da cidade de origem e dos vínculos afetivos. Uma vez “fashion”, elas se tornam precocemente atrizes no palco especial da sociedade espetacular.

      A questão central dessas meninas é a “identidade”, como é hábito dizer hoje: Quem sou eu? Sou criança ou mulher? Todos me olham como eu se fosse admirável, desejável, mas por que não me sinto atraente?  Dizem que sou uma estrela, mas por que tanto medo do futuro, do desconhecido, de perder tudo de repente? Por que vivo pesadelos de fracasso e de instabilidade do meu “chão”?


Essas são suas dúvidas mais freqüentes, expressas nos desenhos e nas histórias que a psicanalista pediu que contassem. A técnica do desenho-história usada por Miriam para decifrar os enigmas dessas meninas é bastante acurada. Criada pelo psicanalista Walter Trinca, tem sido muito útil para investigar a mente de crianças, adolescentes e, às vezes, de adultos. É um excelente instrumento auxiliar nas psicoterapias e nas pesquisas de campo.

          A apresentação do próprio Trinca ao livro chama a atenção para o risco que correm essas belas meninas “pós-modernas” em busca da segurança material e da fama, muitas vezes sem os meios necessários para a segurança psíquica. Elas podem formar um “Eu sensorial” onde riqueza, poder e bens de consumo as aprisionam em uma superficialidade excitante, mas sem fundo e sem riqueza psíquica. Risco, diz ele, inerente à sociedade em que vivemos e às suas instituições.

        Se for verdade, como diz Jurandir Freire Costa, que não existe experiência emocional sem materialidade sensorial, não devemos demonizar o consumo nem moralizar a aguda sensorialidade do mundo da moda. Mas também não podemos esquecer que certos pacientes da clínica psicanalítica contemporânea (assim como Trinca e o livro de Miriam Tawil) nos mostram a fragilidade de alguns indivíduos com sensação de futilidade, sem profundidade e com um precário sentido de realidade. Todos eles, de resto, muito bem vestidos, em forma e na moda.